quarta-feira, 16 de novembro de 2022

 Eu acho que vou estragar tudo. Ou talvez você o faça. Não, mas de fato, creio que o farei antes. Com minha ansiedade, minha pressa, meu tesão. Avassalador. É que eu tenho um buraco tão grande aqui que cabe você. Inteiro. De pé, de frente, de lado, deitado. Atravessado, atravessando. E ainda sobra espaço. Sempre vai sobrar. Nunca serei preenchida. Mesmo quando transbordo e ainda que transborde. No íntimo - ao contrário do que se experimenta fora - onde transborda também há vazio. Dá pra ser cheio e sem fundo, ao mesmo tempo. E assim, o sou.

segunda-feira, 7 de novembro de 2022

sexta-feira, 4 de novembro de 2022

A começar por ele

   Eu vou te explicar e você vai me entender. A mim, é muito mais cara, nossa amizade. É onde me sinto especial: nas horas que você gasta perdendo tempo comigo. Veja, que aí me sinto diferenciada, destacada, singular. Quando sei que em meio a tudo e todos, você recorre a mim. Veja: sou escolhida. Eleita por ti -mesmo que por mérito de meu empenho e dedicação - aquela que você confia. Talvez eu esteja superestimando meu cargo. Mas deixa, vai. Eu preciso ter reconhecida importância. Não aceito não ter. Independente de onde seja, só quero que seja. E assim, posso seguir satisfeita; consigo abrir mão do resto, de todo resto que já quiz, de todo lugar que já almejei ter em você. Em troca de ter um lugar que é só meu (em ti). Nele eu vejo verdade, e vejo presença, te sinto presente. Nele, nós estamos. Estamos porque queremos, quando queremos. Abre-se um portal, a gente entra, só nós dois. É nosso esconderijo, nosso lugar secreto, de intimidade. Ninguém o sabe. É segredo nosso. Fica entre a gente.

  Eu que não te quero superficialmente e nunca quiz. Orgulha-me ter esse lugar nosso. Tenho a certeza de cada peça fundamental que eu pus para estruturá-lo e hoje ei-lo. Quando te escuto, leio que encontro verdade, verdade que se ausenta em seu beijo, em seu sexo. Sem intenções, sem performar - ou pelo menos, numa escala extraordinariamente menor. Por vezes criava uma narrativa e contexto que, em tocando meu corpo, teatralizava tocar minha alma, numa encenação amorosa-forçada desnecessária. Apenas por achar que eu cairia, que fosse o que eu gostasse de estar vivendo ali. Intencionava o inesquecível, quando na realidade, nada o é. Quando na realidade, eu estava ciente de toda engenhosidade por trás de cada gesto ou frase. Do teatro, só me envergonho por você. Gostaria de dizer "dispense". São tantas as ladainhas que conta sem roupa que de fato só te vejo nu quando está vestido. Falando de si próprio: é aqui que encontro sua nudez. Eu que te quero nu. Liso. No pelo. Na alma. E por isso, abri mão de insistir te querer onde você não se revela. Parei de endereçar a você lugares que você não pretendia estar, tampouco chegavam a te interessar.

   Eu quero de você o que ninguém mais conhece, ou tem. Longe de eu ter um papel de suma importância, destaque; sei-me completamente descartável: em segundo, terceiro ou quarto plano. O que não quer dizer-me inútil, ao contrário, sinto-me insubstituível, ímpar, indelegável. É de onde advém o sentir-me especial.

    Saber meu lugar, nem sempre é fácil, mas sei o quão necessário é. Se a princípio nele me pus por bom seno, e por vezes cai em contraditório por não o aceitar, hoje o tenho mais claro, calmo, condizente e confortável. E meu. Se ontem eu lutava por querer mais, hoje reluto quando você quer ultrapassar suas fronteiras e misturar as peças que eu tanto trabalhei para que se encaixassem harmonicamente. Gosto da harmonia. Gosto muito da harmonia. Gosto muito de poder ter harmonia aqui e saber que não precisei te abandonar. O que estamos fazendo com nós dois é o melhor que podemos fazer com nós dois. Não há um "mais" possível, não há um "melhor" possível. É bom saber estar no topo. Eu gosto, só gosto. E não (te) espero mais.

    

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

Travessia

    É que eu me sinto como ponte. Estrada, avenida. Eu te sirvo para o percurso. Te levo de um lugar, a outro lugar. E então, você segue. Sinto-me mesmo, às vezes, como chão. Chão para que o outro passe por cima. Você vai e eu lá fico. 

  É difícil que ninguém fique, só passe. Sinto falta de ficar. Sinto falta de sair. Sinto falta. Falta. Tem quem (me) atravesse mais devagar. Tem quem acelere de repente. Tem quem passe tão depressa. Tem quem nem repare que eu estou (sou) ali.  Tem quem carregue tanta carga e tão pesada, e eu a sinto em mim, pesando. Só é certo que, por fim, todos passem. 

 Tanto vai e vem me deixam marcas, buracos, pedras soltas. E quando me chove, é ter que lidar com a lama que fica, e me transbordam os buracos. Não consigo me levantar. Chego acreditar em natureza, natureza humana, natureza ponte. Mas é só porque preciso acreditar, justificar, entender. Que mais fácil é crer que sou obra de fora e não de dentro; que há um criador que ao criar, escolheu para mim o lugar de ponte e não de banco de praça, ou de pracinha, ou de parquinho... Assim, isento-me. Isento-me da responsabilidade de ser o que sou. E se não consigo transmutar-me em outra estrutura, sigo buscando um melhor jeito de sê-lo. Acovardo-me em buscar aí, beleza. A beleza do ser-ponte. Romantizar é o instrumento que uso para não me mover. Como me é caro, minha estrutura. Aceito inteiramente minha condição e nos enfeites que dou, experimento alguma liberdade. Finjo que sou a dona, e agora sim, obra de dentro e não de fora. Acho meu jeito de ser ponte. Abraço minhas rachaduras e assumo que são minhas.  Mais que isso: encontro nas minhas rachaduras um propósito, sem ficar presa no lamento de sua existência. Abraço meu ser ponte. Agarro-me em ver nele uma beleza que logo hei dizer. E só assim consigo fazer as pazes, com o que sou, abandonar a vontade do que não posso ser - carrinho de pipoca?

  Pois me diga você: se não há beleza em ser responsável por dar alguém uma passagem tranquila e segura? E se não é mais importante o caminho que os fins? E se esse meu modo não consiste puramente em respeitar o direito de ir e vir? E se tão logo, aqueles que se vão, também retornarão? Uma, duas, ou quantas vezes mais? Porque ficaria presa na dor de que não permaneçam. Viro o jogo a meu favor. 

   Se pego na sua mão e contigo atravesso. Sinto que fico o tanto que durar o percurso e então, é isso. Aproveitar o percurso sabendo a finitude, saber dizer adeus. 

   Na travessia, tantas coisas, e você sempre terá boas lembranças, aprendizados. Se isso não for belo, questionarei a estética; se acaso não pense assim, duvidarei de seu bom gosto e senso.

     Viver no transitório parece incessante e sem descanso. Sem pausa. Não se pode repousar. É estar sempre em movimento. Perpétuo. Eis a sentença. Sinto-me, mesmo, esgotada. Nessa, acabo me esquecendo que é preciso fazer reparos em mim e cuidar das deformações. Bom seria se alguém viesse e me deixasse nova, inteira. Mas talvez eu seja grande demais para que um só consiga (já que eu mesma, olhando daqui, não consigo ver nem meu começo e tampouco meu fim). Mas talvez, eu seja totalmente funcional como sou. Mas talvez, a vida seja mesmo isso. Mas talvez, eu precise muito manter essas imperfeições. Mas talvez, não haja nada para além disso. Mas talvez, o que eu quero não exista. Mas talvez isso seja eu, e meu eu dependa de ser assim - remendo. Meu modo. Modo tão longo e breve, como uma ponte. Estrada, avenida.


"Eles passarão, eu passarinho" - Mario Quintana

domingo, 11 de agosto de 2019

Carta aberta a quem possa vir a ser por mim no fim de minha vida

  Venho aqui, deixar uma lista de coisas que me são caras. Não sei a quem caberá minha guarda quando minha saúde mental e capacidade de discernimento, se forem. Sei tampouco se lá chegarei. Mas sei de coisas que gostaria, encarecidamente, que fizessem por mim. No caso de você, que me está lendo, encontrar-se comigo nesse estágio de minha existência, venha me ver  e me encontre em alguma situação onde me falte claramente, quaisquer uma dessas coisas, por favor, peço que interceda por mim. 
Acredito que a internet ainda esteja reinando lá na frente, a todo vapor e esta postagem acabe, eternizada e facilmente acessível. Peço a você, então, que mostre-a ao meu cuidador descuidado. 
Bem, vamos a ela.
  Peço, primeiramente e sobretudo, paciência: você também ficará velho, talvez já até esteja. Segundo: obrigada por tudo que tem feito a mim, espero que ter feito a você enquanto pude e se não o fiz, perdão. Perdão também por todo transtorno que possa estar causando, por aquele que já causei e pelo que está por vir. Fique certo de que não é de minha vontade tudo isso. Não. Antes morrêssemos quando não mais fossemos donos de nós mesmos.
   Peço- te que não me deixe sem banho, exceto nos dias de extremo frio, sou uma pessoa muito asseada e tenho pavor a estar suja. Também não me afeiçoa a ideia de conviver num ambiente de imundice. Não sou do tipo que ouve muita música, sou mais do silêncio ou do barulho da televisão. Obviamente que uma música faz bem. Opte por samba, porque samba me deixa alegre. Saber o que deixa alegre pode ser uma carta na manga, posto que eu possa chegar ao fim da vida meio ranzinza ou talvez, deprimida. 
Ponha-me no sol um pouco (não vá me esquecer lá torrando, heim). Quando me deixar lá, me deixe munida de bons óculos escuros, tenho olhos sensíveis.
   Faça-me fazer exercícios, eles me foram imprescindíveis a vida toda e também me fazem feliz (acrescente isso à lista do samba com título: felicidade). Caso minhas amigas estejam vivas, dê um jeito para que eu possa vê-las de quando em vez. Certamente isso fará toda diferença para mim, o que também pode ser favorável a você, posto que, tornará seu trabalho mais fácil. Sei que se eu estiver bem, darei menos trabalho. 
   Sempre, após o banho, me lembre de usar um hidratante e se caso eu não estiver em condições de passar eu mesma, por favor, use-o em mim. Cultivei esse hábito a vida inteira. A pele seca me incomoda profundamente. 
  Deixe à minha disposição, lápis de cor e papéis, e imagens bonitas. Faça-me escrever. Sobretudo, te peço: faça-me escrever. É onde minha alma se organiza. Se o corpo é digno de pena e a mente se tomou de confusão, deixa-me no conforto das palavras, porque o coração ainda pode ser que prescinda de alívio. E, quando eu me for, conte histórias sobre mim ou leia as que eu deixei por escrito.
  Grata.

sábado, 6 de janeiro de 2018

  É incrível o quão perversa pode ser a vida. O quanto ela é ardilosa, o quanto insiste em bater nos pontos fracos. Como ela engendra meios de atingir as chagas que nos são mais caras, mais doídas. Admirável a capacidade da vida em nos derrubar por atingir em cheio as nossas questões mais insuportáveis: aquilo que de nós mais abominamos, o que mais repelimos e queremos distância, aquilo em nós que menos queremos olhar ou refletir ou questionar ou mexer. A vida quer pisar nos calos, expor os nós das entranhas. Quer saber da sua consistência. O quanto de pancada você aguenta sem ceder, mantendo-se firme aos seus ideais permanecendo o mesmo, sendo fiel a você mesmo... eis o que ela quer saber. O quanto você aguenta ser torturado pelo mundo, sem se deixar perder? Qual seu limite? A partir de que ponto você começa a se render?
   Sinto que regredi. Logo eu. As experiencias vão nos levando a mudanças, as vezes, tão radicais e impensáveis que em certo momento já não nos reconhecemos bem. Não sabemos quem somos, quem nos tornamos, o que permitimos que a vida fizesse conosco. Viver deixa marcas. Algumas são demasiadamente doloridas. Marcas, de uma amargura tal, que entala na garganta e dali não passa. Emudece. Há perigo nesses silêncios. Há perigo... Porque se não atinge a língua e vai boca afora, retorna ao interior e lá permanece. Ocasionalmente, sente-se o estômago revirado por  má digestão de palavras. As entranhas sofrem. A alma se encolhe, ensimesmada. Dores. Doloridas dores. Dores em tons de cinza. Opacas, sem brilho. Dores cheias de ar; comprimindo os pulmões, comprometendo o volume da respiração. Falta de ar.

    Até onde você suporta que doa? por acaso lhe é conhecido seu ponto fraco? Seu calcanhar de aquiles, você sabe citar? Que lugar a vida é capaz de chegar e te submeter, te reprimir, te agredir, desconcertar, até que você chore de medo? Até que você sucumba as regras impostas? E simplesmente aceite. E simplesmente se anule. Enfraquecendo os ideais, afrouxando as convicções...? Fazendo ruir por terra cada tijolinho que você se esforçou para por no muro durante todos os anos de sua existência-casa? E vira brinquedo de outrem. E já não escolhe por vontade própria, e já não almeja mais os próprios sonhos.E se pega a falar de coisas que jamais pensou dizer. E defende posições que jamais lhe pertenceram. E se vê a relativizar questões cuja resposta era implacável. Torna-se vacilante, incerto, inseguro. Teme as consequências de cada ato e já não age como antes. Já não se veste como antes, já não se porta como antes. A ferida, por tantas vezes cutucada, já não aguenta mais qualquer aperto. E aí você é domado em seu lugar mais seu. Intimamente perturbado. Intimamente penetrado. Intimamente vacilante. Em cerne, corrompido.

segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Outro dia, fui eu quem cochilou na rede do quintal. Havia feito tanto calor naquela noite, consequentemente, eu havia dormido muitíssimo mal. Mesmo com todo o bafo que fazia de tarde - daqueles que se vê o vapor brotando do chão e distorcendo a visão do horizonte - o sono me venceu e eu dormi ali mesmo, embalado no balanço da redinha. Tinha uma borboleta, grande. Grande não, gigante, tanto que mais parecia um morcego. Azul-turquesa. Turquesa real, da mais alta realeza. Tratava-se de um animal nobre. Voava, e as asas refletiam a luz do sol forte que batendo na vista, cegavam a qualquer um que olhasse. Que insetinho mais deslumbrante. Lindo, mesmo e demais. Uma cena linda, encantadora. Sublime, de fazer qualquer queixo ir ao chão. Uma natureza pura e radiante que faz a gente constatar a existência e perfeição de Deus, criador, e pensar na beleza da vida, na beleza das coisas, na grandeza do mundo.  Apaixonado por ela, levantei e arrisquei segui-la. Ela dançando no ar, toda formosinha, parecia que sabia que estava sendo admirada, parecia querer mesmo me conquistar e que era de propósito que se rebolava toda. Ia e vinha, brincando comigo, dando e me tirando a esperança de uma aproximação. Eu sorria para ela com cara de pateta, complemente hipnotizado, entregue, devoto. Absorvido por sua doçura e delicadeza de movimentos. Imerso integralmente naquele instante. Só havia eu e ela, mais nada. Por quanto tempo permaneci no transi? Não sei ao certo. Podem ter sido minutos, pode ter sido uma vida inteira. Perdi a noção. Pareceu eterno, mas não pode ter sido. Porque houve depois, houve um agora, houve e está havendo esse momento em que me encontro e te encontro, de estar aqui te contando tudo, de estar sendo lido por você. Eu acredito que quando dá pra contar é porque já virou passado. E o eterno não tem passado - ou tem?. Por isso, devem ter sido breves os momentos em que estive ali, entregue de corpo e alma para aquele bichinho. Nas mãos de um ser que só tem asa. E sem mãos não pode me segurar. E foi aí que eu cai. Na rede, de bruços, dormindo, acordei. De súbito, meio sem ar, assustado, dei um pulo só. Procurei pela minha amada borboleta. Esfreguei os olhos com as mãos, tentando limpar qualquer possível obstáculo. Respirei, e vasculhei toda a realidade em torno. Não era real. Meu coração se partiu - deu para ouvir o barulho. Iludido e de volta ao mundo, dei um tapa num pernilongo que me picava no alto da canela. Eis o inseto que me cabia.

quinta-feira, 15 de junho de 2017

Inesperadamente, me lembrei da primeira vez que saímos. Chovia muito, eu estava de vestido e lembro de ficar com as pernas respingadas. Lembro de estar acima do peso, lembro de termos tomado um suco que nunca mais vi mistura semelhante. Nem voltando aquele lugar. Acho que a criatividade do dono não vendeu e retiraram do cardápio. Mas, era bom, o tal suco. Pedimos sabores diferentes e eu experimentei o seu. Ou não, talvez isso não tenha acontecido e seja só minha memória criando coisas. Sei que conversamos bastante, por horas. Você estava com o rosto tomado por espinhas. Você me levou até o ponto de ônibus e eu esperei por uma aproximação maior até o último minuto. Nada aconteceu. Cheguei em casa num misto de insegurança e certa esperança. Por um lado, acreditei que havia timidez de sua parte; por outro acreditei que talvez eu não fosse demasiado atraente. A julgar pelo todo, sabia que haveria outro encontro e que talvez houvesse ali algo a que me escorar, por um tempo. Desde do primeiro dia, o que senti não passou de sentimentos mornos. Não sei porque lembrei disso hoje. Acho que nunca mais havia voltado aquele dia, pensado sobre ele. Em quais pessoas estavam ali, cruzando as vidas. Sem saudade ou julgamento, apenas remonto aquele dia, despretensiosamente. Assim, só por lembrar.

sábado, 10 de junho de 2017

Nem tão mais a contragosto, sou obrigada a concordar com seu ponto de vista. Mesmo com todo amor do mundo, não duraríamos uma semana juntos. Verdade. Há muita complexidade em você onde para mim é apenas simples. E nisso, o vice-versa é uma certeza. Valores que não se cruzam, preocupações que não conjugam, angustias que não comungam entre si. Díspares em pensamento e percepção de vida. Questiono se nós nos compensaríamos. Se acaso, nos seria possível uma relação de complementariedade, onde um preencheria o exato ponto em que o outro falhasse. Já que um é bom onde o outro se amedronta e se desanda, há o viés de que um ajudaria o outro nas mazelas e dificuldades. Bom, é sempre possível, claro. Contudo, nem sempre viável, ou desejado, ou almejado. Há sentimentos em mim por você que ainda carecem sublimação. Há doses de apego e consequente ciúme, que só fazem envenenar-me. Hoje entendo que meu caminho há sempre de ser o oposto ao sofrimento, e eu preciso mirar aquilo que me afasta da dor. Pensamento este que busco impor a toda minha vida e a cada relação que se faz em meu caminho e em mim. A eterna busca de ser alguém melhor; a eterna busca pelo sentido das coisas, pela transcendência. Busca ativa, consciente, persistente. Sem pressa ou cobrança, mas eterna: que nunca cessa, que nunca estagna. Propósitos que nem sequer acredito que você entenda, ou imagine existir em mim. Busco pela  fórmula de te amar como você é, mais ainda sigo sofrendo por te querer por perto. Estou eu na fase de aceitar que você tem vida própria, escolha própria, vontade própria. E aceitar seu jeito de querer a todas, sem na verdade querer nenhuma. Minhas peculiaridades te surpreendem. Algumas te encabulam, umas te deixam inseguro, outras desconfiado e ainda há aquelas que te despertam interesse, desejo, querer. Sei que não as vê em mais ninguém. Não estão entre as coisas pelas quais tem afinidade ou está acostumado. E bem sei que nem sempre sabe ou se interessa, por lidar. Não as quer tão perto como é da minha vontade. Como foi da minha vontade. E já não é mais, e cada dia é um cadinho menos. E entendo que o caminho a seguir é o do constante desapego, do respeito a você enquanto ser humano livre e dono de si. Seguir cultivando o carinho e aniquilando a necessidade. Esforçando-me para ser feliz quando você é feliz, em suas escolhas, e naquilo que opta por vivenciar. Amar a você e suas experiências e respeitar tudo que vem de você de peito aberto. Sem que me sinta atacada, reprimida, intimidada, excluída, traída, humilhada. Sempre no caminho contrário a tudo que torna meu espírito pobre, afim de atingir mais e mais minha própria libertação.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Quando eu a olho bem dentro dos olhos, um frio me passa por minha espinha. Um medo toma conta de mim dos pés a cabeça. Todo meu corpo é inundado por esse medo que me aperta o coração que nem a gente faz com tubo de pasta de dente quando ele está no finzinho. Eu bem sei a causa desse sentimento, e o quanto é natural que assim o seja. Depois de tudo, de tanta vida que passou, tantas histórias de amor vividas, sofridas, superadas mas não apagadas. Diante de toda novidade que ela me traz, que ela me causa, toda novidade de sentimentos. E bons sentimentos. Me permito sentir esperança, novamente. Otimismo. E obviamente o temor assustador de quebrar a cara (outra vez). Ela é tão nova, tão ela, tão cheia de vida. E me encanta, todo seu frescor e falta de calos no coração.
Só com ela meu peito se ilumina, meus olhos se colorem, e minha cabeça se perde a construir um futuro, entre mil planos e cenas felizes protagonizadas pelo amor que sinto por ela. Tento maneirar nas expectativas e na grande besteira que é tudo isso, que é condicionar nossa vida a de outra pessoa. Me estremesse pensar no risco que me submeto em tanto querer atrelas minha vida a dela. No fato de que ela é livre para escolher e optar por outro destino. Mas me permito perder o juízo e me entregar as delícias da fantasia. Eu te pergunto: como não querer essa mulher? Como não querer pertencer a ela, aos seus sonhos, ao seu desejo, ao seu carinho... como não deixar que ela me hipnotize e faça de mim o que bem querer. Como não querer acordar ao lado dela a cada manhã, abrir meus olhos e ver antes de qualquer outra coisa, essa pele recém nascida, sentir esse cheiro doce de quem parece estar sempre limpa, esses cabelos macios, e essa carinha que a noite toda vez amarrota. Como não querer essa vida? Essa vida com ela ao meu lado. Eu a quero acompanhar crescer, a quero acompanhar descobrir o mundo. Ouvir suas histórias diárias, as queixas, as coisas engraçadas, os contratempos. Como não querer protegê-la dos males do mundo, comprar brigas em seu nome, prometer o impossível e tantas outra coisas pelas quais sei que vou fracassar. Não importa, que fracasse. Quero fracassar com ela, por ela, diante dela. Não quero um amor falso, quero um amor vivo, imperfeito. Um amor Torto. Porque para mim, só assim é belo, só a verdade é bela, a nudez, o sentimento cru, diante de mim, exposto até o osso, tal como é. Sem máscara, sem firulas, sem disfarce, sem fingir ser o que não é. Amor de carne, osso e sangue. Pra valer, humanamente, humano. E ainda assim, sublime. Divinal.
Que me perdoem as fadas, mas não quero seus contos, quero apenas contar. Contar cm ela, para toda vida, para as alegrias, para me frustrar, para sucumbir, chorar de raiva, chorar de rir, chorar, para o Natal, páscoa e os outros feriaods. Para viajar, para ficar em casa usando meias, para faxina, para cozinhar, para carregar sacolas de compras.Aturar parentes, aturar falsidades, fazer artesanatos. Escolher um par de sapatos ou a marca certa do sabão em pó. Quero essa mulher para termos filhos, para formarmos uma família. Talvez comprar um carro, talvez fazer uma horta.
Porque esta mulher me devolveu o sangue das veias, o calor do corpo. Recolocou a poesia que há em mim em seu devido lugar. E se você esta me reconhecendo nesse texto como há tempos não me reconhecia, não é ilusão sua. É tudo graças a ela. É a ela à quem devo, por ter recuperado a mão da minha escrita.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

       Uma vez, eu tive um amigo. Uma vez e não mais que uma vez. E ele me levava para ver as estrelas: o céu mais bonito que eu já vi na vida. Eu ria dele e ele ria de mim, e as vezes era só mesmo rindo que a gente se entendia. Na verdade, a gente nem falava muito. A gente passava longos tempos em profundo silêncio. Mas é porque não precisava, não precisava falar nada. Porque bastava ficar perto, ficar perto já era o suficiente, já era tudo o que a gente precisava: toda companhia. Toda natureza, e toda a companhia. Cada um na sua, pensando na própria vida, mas junto, a dividir o momento.
       Uma vez, eu tive um amigo. Eu tive um amigo uma vez, uma vez. Mas, assim como tudo na vida é breve e tem determinado tempo para existir, essa amizade também se foi. E o tempo a levou, assim como leva a todas as coias, pra um lugar que eu não sei. Talvez o passado. Talvez seja lá onde more as coisas que o tempo leva: o passado, a lembrança, a saudade. Porque o que não é a vida, senão um eterno aprendizado de dizer adeus? Que é a vida senão uma eterna despedida, um eterno despedir-se. Um eterno ir e vir, à espera do fim maior.
        Eu queria ter o poder de negociar com o tempo para que ele me deixasse ficar um pouco mais com algumas pessoas. Eu queria chegar ao pé do ouvido do tempo e pedir-lhe encarecidamente bem baixinho que ele se prolongasse um pouco mais, só um pouco mais.As vezes E me deixasse ficar um pouco mais com as pessoas que eu amo. E que esquecesse um pouco de si mesmo, se prolongasse e postergar-se o adeus. Para que eu pudesse aproveitar um pouco mais. E ficar um pouco mais. Só um pouco mais.
Mas o tempo, parece mesmo ser irredutível, inegociável. Impossível de ser dobrado.

terça-feira, 29 de novembro de 2016

Foi conversando, despretensiosamente, no trabalho, dia desses, que me dei conta de uma peça fundamental para o quebra-cabeça passado. Na conversa, entre uma brincadeira e outra sobre o cotidiano das tarefas, falei com uma amiga "Eu, que na verdade, sou uma boca aberta". A amiga tranquilamente confirma: "É o que eu sempre te digo". É verdade, ela sempre diz. É verdade, a boca aberta sou eu. Por mais que aja maldade ou malícia, pareço sempre estar atrás nisso com relação aos demais. Aí me veio uma ideia, nunca antes pensada, sobre aquela menina que eu me relacionei antes. Você mesma, que está nesse momento me lendo e acredito que já suando frio. Por ser uma criança, me falta essa malícia e maldade dos adultos, mas me sobra espontaneidade e sinceridade, bem próprias as crianças. E nessa, falo mesmo quando quero, o que acho necessário. Quem vem me ler, vem por que quer e então ambas as partes estão comprometidas nesse meu jeito rude de vomitar palavras: exponho, mas você vem me ler e assim, se torna cúmplice. Culpado. Pois bem, e é mesmo sobre culpa essa pauta aqui. Acabei me dando conta que, há possibilidade de que o sentimento que te faz ligada a mim seja bem esse: culpa. Por muitas e muitas vezes me peguei tentando entender. Não me venha com amor. Amor é desprendido e de nada precisa. Não a fixação, minha cara. Essa que te vem sugando a beleza, aniquilando seu brilho. E você só faz alimenta-la e entregar-se para ser consumida por ela. Pela culpa. É porque você me traiu, muito antes que eu tenha entendido. Porque já te havia percorrido o pensamento nessa cabeça sonsa que agora, ao me ler, esta com o peito travado e a garganta congelada. Eis seu mistério escancarado. Quis estar com outrem quando ainda comigo. Notoriamente se consome, por toda vida e por tantos motivos nesse sentimento moral: culpa. Culpa-se por a muito tempo e por muitas coisas. Fez sua vida toda culpando-se. Por suas escolhas, por beijar quem beijou, amar quem amou. E por mil coisas mais, pequenas, talvez tao minusculas que você foi encobertando por toda vida. Mas, sempre culpando-se e julgando a si mesma. Condenando. Sem coragem para brigar com o mundo em causa própria, em assumir-se. Como poderia, quando na verdade concordava com quem te acusava? Achava-se mesmo indigna, errônea, errada, suja. Pois bem, se acostumou ao modelo. Ao modelo de ocultar-se, esconder-se. Como um gordo que jura não comer em demasia e de fato, muitas vezes se priva em público, mas quando a sós, dá vazão a toda gula que consegue sentir. Vícios. Minha verdade te reprimiu. Escondeu-se o quanto pode, em si mesma. E como quem tem medo da bronca da mãe, mentia sobre quem era. Foi tanto que se confundiu entre a verdade e a mentira e teve que dedicar bom tempo a se encontra novamente. E, não seria espantoso que ainda estivesse a fazer isso. Não, não te culpo. E peço que, faça o mesmo. Sempre entendi desejo e atração sexual de uma forma bem mais livre. Sempre te deixei a vontade. Tudo bem, sempre soube que você era sonsa mesmo e sempre te disse. Já queria essa pessoa aí, flertou muito tempo antes. Quiz e se sentiu culpada. Cagou tudo ainda mais entre nós. Te perdoo antes mesmo de ter ficado ofendida. Ora, fique em paz, e seja de verdade o que sua boca tanto diz.  Não me importa, sabe. Agora que me caiu essa peça na cabeça, ficou ainda menos importante. A decisão sempre mais certa e o desprendimento maior. Mas claro, são só textos. Devaneios ditos pelos não-ditos. Se reais ou não, pouco importa. Se certeiros ou não, direcionados ou não. Eu quero é rir desse meu leitor, que acaba também atras das peças que corroborem minhas histórias.