terça-feira, 19 de abril de 2016

É, a gente está no começo. E só por isso perco várias vezes o fio da conversa e deixo escapar do ouvido frases que ela me diz por prestar atenção no jeito que ela mexe nos cabelos enquanto fala ou na forma como surgem covinhas em seu rosto quando levemente algum trecho a faz sorrir. E, apatetado, sorrio em concordância com o que não sei, gelado pelo pensamento de que talvez ela tenha percebido a admiração que ela me causa. O sexo ainda está no forno: arde, queima. Eu a sinto com meu corpo inteiro, ela se esfrega em mim como bicho, se derretesse em cada toque e mostra nos olhos tudo que espera de mim. É a maior proximidade que existe no mundo, que chega mesmo a me invadir com pressa e tomar tudo que há em mim. Já não penso nada, só sinto. Quero morder, quero lamber, olhar o que ela sente, ter o prazer dela nos meus olhos, bem a vista, e entre as minhas mãos, e em cima de mim e embaixo também, e dentro da minha boca e por toda - a minha - parte. Naquele instante sou todo presente, estou ali e com ela, íntegro, em plenitude. Sinto medo que os anos levem de nós esse calor, fazendo a gente se acostumar com o que nossos corpos oferecem um ao outro.
Parecemos ter saído da mesma safra, é estranho que ela goste do que eu gosto, do exótico do meu gosto próprio. Divido com ela cada esquisitice que só resta rir. E rimos toda vez que fazemos alguém de bobo contando uma historinha nova ao responder a pergunta clássica do "como vocês se conheceram?". Porque esse se tornou nosso segredo, decidimos inventar uma mentira a cada vez que respondemos a pergunta. Sai no improviso e nos controlamos para não rir de tudo e para que pareça tudo muito real, encenamos como ninguém e desafiamos uma ao outro a caber em cada parte proferida. Se tornou a nossa brincadeira e os olhos chegam mesmo a brilhar quando algum inocente nos faz essa pergunta.
Tenho o  desejo de lhe contar todas as coisas e de me fazer entender tudo que eu mais escondo sobre mim mesmo. A ela quero dar o que ninguém sabe sobre mim, o que há de mais oculto, vergonhoso, improvável, secreto, angustiante. Porque, de uma forma intuitiva e apenas intuitiva, acredito que ela seja capaz de entender e ficar. Ainda mais: que consiga me ajudar a carregar tudo isso. Tudo isso que sou, que fui e que serei. E de uma forma louca a quero em todas as partes da minha vida e não me vejo sem ela em mais nada. A quero comigo em tudo que há e que possa vir. Um futuro todo nosso. Sem vão. E nisso cabe até as fendas necessárias para que cada um tenha seus momentos, para que nada acabe morrendo sufocado  (nem nós e nem em nós).
Tenho certeza de que vai dar errado e que vamos nos desgastar, e vamos ter dúvida do que estamos fazendo e vamos questionar se é o que queremos. É que sempre dá errado, não há jeito. É que mesmo assim funciona, e vinga. E dá certo para todo o sempre e para o resto desses meus dias, dessa minha existência, a multiplicar esse amor, ao lado dela.